Por Marcelo Zurita
Astrônomos de todo o planeta estão de
olho no Asteroide Apophis, um dos mais temidos pela humanidade. Eles estão
aproveitando sua aproximação da Terra para estudar a gigantesca rocha espacial.
E essa será a melhor oportunidade de observação desse asteroide antes de 2029,
quando o Apophis fará uma passagem de arrepiar.
Descoberto em junho de 2004, o Apophis
fez uma aproximação da Terra, nos últimos dias daquele ano, que deixou a
comunidade internacional em polvorosa. Percebeu-se que havia uma chance dele
atingir nosso planeta em abril de 2029, curiosamente em uma sexta-feira, 13.
Naquela época, à medida que novas observações eram adicionadas aos cálculos, a
possibilidade de impacto aumentava. As chances de impacto chegaram aos 2,7%, o
que causou certa apreensão em todo o planeta.
Asteroide
Apophis (pequeno ponto no centro da imagem) registrado no Hawaii – Imagem:
Universidade do Hawaii
Esse asteroide tem cerca de 340 metros
de diâmetro médio (450 metros de comprimento), 41 milhões de toneladas e
energia equivalente a 60 mil bombas de Hiroshima. Se ele atingisse a Terra,
seria capaz de devastar milhares de quilômetros quadrados e causar dezenas de
milhões de mortes. Fica fácil entender porque ele recebeu o nome de Apophis, o
Deus egípcio do caos e da destruição.
Tamanho
do Asteroide Apophis (450m) comparado ao Empire State em Nova Iorque (443m), à
Torre Eifel em Paris (324m) e ao Pão de Açúcar no Rio de Janeiro (390m) –
Imagem: Asteroid Day Brazil
Felizmente, com o refinamento dos
cálculos orbitais ainda em 2004, concluiu-se que não há chances de impacto em
2029. Entretanto, ele fará uma aproximação da Terra de arrepiar, passando
perigosamente próximo do cinturão de satélites geoestacionários e a cerca de 32
mil km da superfície do nosso planeta. Tão perto que poderá ser visto a olho nu
de alguns locais do planeta, incluindo parte do Brasil.
Aproximação
do Apophis em 2029 passando bem perto dos satélites geoestacionários (pontos
azuis) – Imagem: NASA/JPL-Caltech
Após o susto inicial, alguns
astrônomos passaram a se preocupar com a possibilidade de que um desvio
orbital, provocado nessa aproximação em 2029, pudesse colocar o Apophis em rota
de colisão com a Terra em 2036 ou 2068. Mas um estudo publicado em 2013 afastou
a chance de impacto em 2036 e reduziu para quase zero as possibilidades em
2068. Só que não dá pra relaxar com um asteroide tão perigoso rondando nossa
vizinhança.
Desvio esperado na trajetória do Apophis provocado pela interação gravitacional com a Terra durante a aproximação de 2029 – Imagem: NASA/JPL
Recentemente, um novo estudo, publicado por astrônomos da Universidade do Hawaii, mediu a influência do Efeito Yarkovsky na órbita do Apophis. O Efeito Yarkovsky é uma pequena força provocada pela radiação térmica de pequenos corpos em rotação no espaço. Dependendo do sentido e velocidade de rotação, da temperatura média e do albedo, o índice de refletividade do asteroide, o Efeito Yarkovisky pode empurrar ou puxar o objeto em direção ao Sol.
O estudo foi chefiado por David
Tholen, que foi um dos descobridores do Apophis em 2004. Analisando novas
medições, feitas a partir do Telescópio Subaru, de 8,2 metros, no Hawaii,
Tholen e sua equipe concluíram que o Efeito Yarkovisky está provocando um
deslocamento de 170 metros na órbita do Apophis a cada ano. Parece pouca coisa,
mas para um asteroide com órbita tão próxima da Terra, esse pequeno
deslocamento acumulado ao longo dos anos pode ser a diferença entre uma
aproximação muito próxima e um impacto catastrófico.
Considerando o desvio cumulativo na
órbita do asteroide, a equipe revisou para cima as chances de impacto em 2068.
Apesar da possibilidade ser muito baixa ainda, cerca de 0,00067%, o estudo
reforça a necessidade de acompanharmos de perto o Asteroide Apophis.
E é justamente isso que vários
astrônomos de todo o planeta estão fazendo. Nesse momento, o Apophis está
passando a cerca de 17 milhões de quilômetros da Terra, o que não é tão
próximo, mas cria uma excelente janela de observação. Por isso, a IWAN – Rede
Internacional de Alerta de Asteroides criou a “Campanha de Observação do
Apophis 2021”, que visa aprender o máximo possível a respeito dessa rocha
espacial antes de sua maior aproximação em 2029.
Asteroide
Apophis registrado pelo Observatório SONEAR em Minas Gerais – Créditos: SONEAR
Em um dos exercícios dessa campanha, o
Apophis foi “redescoberto” e reportado como um novo asteroide. E a partir
dessas novas observações, os astrônomos estão seguindo todos os processos,
recalculando sua órbita, riscos de impacto com a Terra, prováveis locais
afetados e até mesmo discutindo possíveis medidas para redução de danos. O
curioso desse exercício é que, até o momento, utilizando as medições feitas
desde dezembro, as chances de impacto foram calculadas em cerca de 10%. Isso
significa que, se tivéssemos realmente descoberto o Apophis somente agora,
estaríamos todos bastante preocupados, já teríamos bares e igrejas lotados e
algumas pessoas pelas ruas vestindo placas alertando que “o fim está próximo”.
Obviamente, essas chances devem ser
reduzidas à medida que novas observações forem adicionadas aos cálculos,
tornando a órbita do asteroide mais precisa, confiável e semelhante à órbita
real, calculada a partir de mais de 15 anos de observação.
Grandes telescópios e radares, dos principais observatórios do mundo que trabalham na pesquisa de asteroides, estão aproveitando essa janela de observação para coletar dados mais precisos a respeito da órbita e das características físicas do Apophis. Tudo isso servirá como uma preparação para 2029, quando será necessário medir, com a maior precisão possível, os efeitos desta aproximação na órbita do asteroide. Qualquer mínima variação inesperada pode afastar definitivamente o risco de impacto, ou colocar o Apophis em rota de colisão com a Terra em 2068.
Espectro
de refletância do Apophis, observado com IRTF da NASA, compatível com um
asteroide tipo Sq (rochoso/metálico) – Imagem: David Polishook/MIT
Somando-se a esse esforço, a NASA
cogita a possibilidade de enviar para o Apophis a sonda espacial Osiris-Rex,
que atualmente está visitando o Asteroide Bennu. Em setembro de 2023, a sonda
trará para a Terra uma cápsula com amostras do Bennu. A partir de então, ela
estaria disponível para uma missão adicional, e um dos destinos considerados é
justamente o Apophis. Se isso for confirmado, a sonda deve alcançar o asteroide
apenas em abril de 2029, pouco depois de sua máxima aproximação com a Terra.
Seria mais uma coincidência
interessante, ver Osíris, o deus egípcio da vida após a morte, encontrar
Apophis, o deus do caos e da destruição justamente após seu encontro com a
Terra que causou tanta preocupação por aqui.
Informações mais detalhadas a respeito do Apophis e da Campanha de Observação de 2021 serão apresentadas durante uma Live, organizada por Cristóvão Jacques no Canal AstroNEOS. Cristóvão é um dos astrônomos do Observatório SONEAR, que participa da campanha, e um dos principais brasileiros envolvidos na busca por novos asteroides próximos à Terra. O evento está marcado para o sábado, 06 de março, a partir das 20:30h.
* Marcelo Zurita é
presidente da Associação Paraibana de Astronomia – APA; membro da SAB –
Sociedade Astronômica Brasileira; diretor técnico da Bramon – Rede Brasileira
de Observação de Meteoros – e coordenador regional (Nordeste) do Asteroid Day
Brasil
Disponível em: https://olhardigital.com.br/2021/03/01/ciencia-e-espaco/o-temido-asteroide-apophis-se-aproxima-da-terra-e-e-vigiado-de-perto-por-astronomos/
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